Vimos que “o presente ‘humano’ é caracterizado pelo fato que ele é dinamicamente tenso entre o passado e o futuro. Nunca é um presente absoluto, mas somente um presente temporal: presente que remonta ao passado, ao qual porém se subtrai, porque nunca coincide com o próprio passado e porque antecipa um novo futuro a ser realizado. É, portanto, um presente que existe na tensão dinâmica entre o passado e o futuro” (Gevaert, J. Il problema dell’uomo. Introduzione all’Antropologia Filosofica. Elle Di Ci, Torino, 19814, p. 188. Cf. Heidgger, M. Ser e Tempo – Parte II. Vozes, Petrópolis, 1989, § 68, p. 132-149).
O Ser humano pode ser considerado como “uma presença cujo passado é constitutivamente aberto ao futuro (…). O futuro é uma condição constitutiva do Ser humano. Poder-se-ia também dizer, em outras palavras, que o Ser humano é constitutivamente um ser de futuro, de perspectiva, de devir. Na medida em que este devir fica incerto, porque não se realiza deterministicamente (como nos outros animais), poder-se-ia também dizer que o Ser humano é um ‘ser de esperança'” (Gevaert, J., o.c., p. 188-189).
O ponto gravitacional da “temporalidade” humana não se encontra no passado, mas no futuro. “Temporalidade” humana quer dizer ter um futuro. Justamente porque há um futuro cheio de novas possibilidades – que o Ser humano já encontra ou que ele mesmo cria – o passado pode aparecer na sua figura de passado, isto é, como aquilo que é somente uma realização parcial e provisória, que precisa ser constantemente recuperada e superada (Cf. Ib.).
Percebe-se claramente que o Ser humano ocupa no mundo – na Terra, no Universo – e, portanto, no espaço e no tempo, uma posição diferente dos outros seres materiais e viventes, uma posição que lhe é peculiar e que dá um sentido novo a todas as coisas.
A “mundanidade” – “espacialidade” e “temporalidade” – torna-se “humana”; ela adquire um “sentido humano”, um “valor humano”; ela torna-se “consciente” (pensante): uma realidade objetiva e subjetiva ao mesmo tempo.
“A consciência jamais pode ser outra coisa do que o ser consciente, e o ser dos Seres humanos é o seu processo de vida real” (Marx, K. e Engels, F. A Ideologia Alemã (I – Feuerbach). Hucitec, São Paulo, 19865, p. 37).
A mundanidade – espacialidade e temporalidade – consciente é a condição existencial própria do Ser humano.
A relação do Ser humano com-o-mundo material e vivente e com-os-outros (semelhantes) é um fato incontestável, indubitável e evidente por si mesmo; não precisa demonstrá-la, mas somente mostrá-la e examiná-la criticamente fazendo ver que é impossível negá-la, sem negar a própria existência do Ser humano. O mundo material e vivente e os outros (semelhantes) impõem-se por si mesmos, irrompem – por assim dizer – na existência de todo Ser humano. O mundo material e vivente e os outros não existem porque o Ser humano pensou e demonstrou sua existência. Antes de qualquer argumento, eles existem (são); sua existência-presença é uma exigência de relacionamento, um apelo dirigido ao Ser humano e à sua responsabilidade. “Eu sou eu e minha circunstância” (Ortega y Gasset, J. Que é Filosofia? (Lição XI). Livro Ibero-Americano, Rio de Janeiro, 19712, p. 184).
Em outras palavras, “as circunstâncias fazem os Seres humanos assim como os Seres humanos fazem as circunstâncias” (Marx, K. e Engels, F., o.c., p. 56). Portanto, a existência do Ser humano é inevitavelmente uma aceitação (afirmação) ou rejeição (negação) do mundo material e vivente e dos outros (semelhantes). O “ser-no-mundo” (inserção), “com-o-mundo material e vivente” e “com-os-outros” (semelhantes) precede toda escolha e toda realização humana. Na relação (comunhão) “com-o-mundo material e vivente” e “com-os-outros” (semelhantes), o Ser humano torna-se capaz de escolher, de aceitar ou rejeitar o mundo e os outros.
A certeza do mundo e dos outros, que se impõe por si mesma, diz respeito, em primeiro lugar, à sua existência como mundo material e vivente e como outros (semelhantes), que se revela e se faz conhecer ao Ser humano, independentemente do seu grau de inteligência e consciência. Em segundo lugar, diz respeito também ao caráter ético da existência do Ser humano, mediante o qual tudo aquilo que deve ser feito para realizar a existência é ligado ao reconhecimento do mundo material e vivente e, sobretudo, dos outros (Cf. Gevaert, J., o.c., p. 34-35).
No próximo artigo – ainda continuando o mesmo tema – refletiremos sobre o Ser humano (no mundo) como “ser-com-o-Outro absoluto” (Deus).